Muitas vezes nos deparamos com situações jurídicas que, apesar de não demandar maiores discussões, acabam sendo judicializadas e gerando perda de tempo e dinheiro para debater o que a lei já definiu. A exemplo, citamos o caso de uma ação de dissolução parcial de sociedade, no qual um dos sócios resolve deixar os quadros societários.
Vamos nos ater a uma sociedade de administração de patrimônio próprio, para que haja maior clareza. Pois bem. No caso que ora enfatizamos, utilizaremos uma sociedade em que um dos sócios subscreveu suas cotas sociais com imóveis. Isso para facilitar o entendimento e ajudar muitos que passam por essa situação e acabam, por ausência de orientação técnica, deparando-se com uma situação inusitada.
Feita esta introdução do cenário que atuaremos, torna-se importante distinguir o que é subscrição e o que é integralização do capital social. A subscrição precede a integralização e nada mais é do que uma promessa de que irá transferir o bem, no caso em comento, um ou mais imóveis. A integralização, por sua vez, é a transferência do bem ou bens imóveis, subscritos, para a empresa constituída. É a realização do capital social.
Assim, se bens imóveis foram subscritos e não integralizados, sem qualquer oposição no decorrer do tempo pelos demais sócios, evidente que esses bens não integralizados não foram transferidos à sociedade, pertencendo, assim, ao sócio que subscreveu, mas não integralizou o capital social com os seus bens imóveis.
É importante dizer que a integralização só ocorre com a efetiva transferência dos bens imóveis para a sociedade, mediante registro no cartório de imóveis do contrato social que esteja com redação capaz de gerar um efetivo registro, ou seja, o contrato social seria o substituto de uma escritura de venda e compra e como tal tem que preencher os requisitos para uma efetiva transferência.1
O Superior Tribunal de Justiça (STJ), através de sua 3ª turma, deixou claro que a constituição de sociedade empresarial registrada em junta comercial, com a subscrição do capital social por meio de imóveis indicados por sócio, não é suficiente para operar a transferência da propriedade nem para conferir à empresa legitimidade para promover embargos de terceiro destinados a afastar penhora sobre os bens. Segundo o colegiado, para se tornar válida, é preciso que a transferência seja feita via registro de imóveis.
“(….) Em se tratando de imóvel, como se dá no caso dos autos, a incorporação do bem à sociedade empresarial haverá de observar, detidamente, os ditames do art. 1.245 do Código Civil, que dispõe: transfere-se entre vivos a propriedade mediante o registro do título translativo no Registro de Imóveis.
Já se pode antever que o registro do título translativo no Registro de Imóveis, como condição imprescindível à transferência de propriedade de bem imóvel entre vivos, propugnada pela lei civil, não se confunde, tampouco pode ser substituído para esse efeito, pelo registro do contrato social na Junta Comercial, como sugere a insurgente.
De fato, a inscrição do contrato social no Registro Público de Empresas Mercantis, a cargo das Juntas Comerciais, destina-se, primordialmente, à constituição formal da sociedade empresarial, conferindo-lhe personalidade jurídica própria, absolutamente distinta dos sócios dela integrantes.
Nos termos dos art. 985 c.c 1.150 do Código Civil, a sociedade empresarial somente adquire personalidade jurídica a partir da inscrição de seu ato constitutivo no Registro Público de Empresas Mercantis, a cargo das Juntas Comerciais do Estados e do DF, condição, portanto, que se revela indispensável para assumir obrigações e adquirir direitos em nome próprio. Enquanto não perfectibilizado o registro do contrato social, os sócios respondem solidária e ilimitadamente pelas obrigações sociais (art. 990 do Código Civil).
Explicitado, nesses termos, as finalidades dos registros em comento, pode-se concluir que o contrato social, que estabelece a integralização do capital social por meio de imóvel indicado pelo sócio, devidamente inscrito no Registro Público de Empresas Mercantis, não promove a incorporação do bem à sociedade; constitui, sim, título translativo hábil para proceder à transferência da propriedade, mediante registro, perante o Cartório de Registro de Imóveis em que se encontra registrada a matrícula do imóvel. (….)”
Assim, demonstradas as irregularidades existentes que justificaram a saída de um sócio da sociedade, em que apenas houve a subscrição do capital social com bens imóveis, sem efetivar a sua integralização, efetiva transferência, não há ordem judicial ou lei que obrigue referido sócio a deixar seus bens para a empresa da qual não mais quer fazer parte. Se os sócios foram desidiosos quanto a tal questão, é evidente que não se pode querer se beneficiar do erro em detrimento da lei.
Assim, há que se atentar quando da constituição de uma sociedade empresária, quanto a efetiva integralização dos bens subscritos, para que se evite, posteriormente, discussões judiciais que darão ao detentor da propriedade do bem imóvel, não integralizado, o direito de sair da sociedade e levar consigo tais bens, posto que assim a lei e a jurisprudência determinam, bem como a lei determina que os sócios sejam diligentes e busquem orientação técnica para que não sejam pegos de surpresa.
Fonte: Portal Contábil SC